FOLHA DE SÃO PAULO |
"Tem que ajeitar o
foco", diz um preso a um colega que acabara de ligar a câmera do celular
em meio a um grupo de detentos rebelados.
Vencida a discussão técnica, o
que se segue é um documento explícito do horror praticado no complexo de
Pedrinhas, em São Luís, no Maranhão, onde 62 presos foram mortos desde o ano
passado.
São dois minutos e 32 segundos em
que os próprios amotinados filmam em detalhes três rivais decapitados. E se
divertem exibindo os corpos –ou que restam deles.
O vídeo, gravado no dia 17 de
dezembro, começa com os presos caminhando por dez segundos dentro da
penitenciária. Para preservar suas identidades, tomam o cuidado de exibir
apenas os pés.
No foco principal, um homem de chinelos pretos e bermuda branca dá
passos apertados, até que no oitavo segundo da caminhada o chão verde molhado
de água se transforma num piso ensopado de sangue.
Dois segundos adiante, a câmera
se levanta abruptamente e mostra o saldo do motim no CDP (Centro de Detenção
Provisória) de Pedrinhas, um bairro da zona rural da capital maranhense.
Estão lá, diante da câmera e de
comentários em tom de comemoração, os corpos de Diego Michael Mendes Coelho,
21, Manoel Laércio Santos Ribeiro, 46, e Irismar Pereira, 34.
A gestão Roseana Sarney (PMDB)
não quis comentar o vídeo, enviado ao governo pela Folha. Disse apenas que
imagens supostamente registradas em Pedrinhas estão sendo divulgadas e poderão
ser alvo de inquérito para investigar a sua veracidade.
CABEÇAS
As imagens, encaminhadas à Folha
pelo Sindicato dos Servidores do Sistema Penitenciário do Estado do Maranhão,
são chocantes.
Nas costas de um desses corpos,
de bruços, estão duas cabeças, lado a lado. Elas são exibidas como troféus.
Ao lado, o terceiro decapitado
ainda tem a cabeça encostada ao pescoço.
Um dos presos grita: "Bota
[o corpo] de frente pra filmar direito". Outro pede: "Não puxa a
cabeça dele".
Em vão. Um outro colega, também
de chinelos, enfia os pés na poça de sangue, se aproxima e, com a ponta dos
dedos, ergue a cabeça, puxada pelos cabelos.
A cabeça escapa, cai no chão, mas
é erguida novamente e colocada ao lado das outras duas. Os presos mantêm o
clima de comemoração.
Fonte: Folha de São Paulo